“Ensinar a ler, a escrever e a fazer contas”, esse seria o conjunto de habilidades que formaria uma resposta padrão se perguntássemos a alguém qual o papel da escola nos anos 1950. Em nossa época, anos 2020, certamente a mesma questão seria respondida de uma forma bem diferente. Quer um indício? Quando digitamos a pergunta no Google, mais de 397 milhões de resultados são encontrados. De um período ao outro, muito se transformou e a educação, cada vez mais, é peça-chave em nossa sociedade. Aqui, os cidadãos brasileiros têm direito e é dever do Estado e da família proporcionarem o acesso à escola para crianças e adolescentes. Porém, embora o papel da escola enquanto instituição tenha tomado outras formas e concepções, algo permanece: é nela que a leitura e a escrita são ensinadas.
A partir dos anos 1990, com as novas tecnologias, as modificações no mercado de trabalho e a abertura política do país, professores que estudavam sobre a temática da alfabetização começaram a problematizar este conceito. Até então, uma pessoa que soubesse escrever ou apenas reconhecer o próprio nome, era colocada na mesma categoria que aquela que sabia escrever conteúdos de alta complexidade. Havia esta dicotomia: a pessoa era, ou não, alfabetizada.
Percebeu-se que era necessário ampliar este conceito e, como tal, um novo termo passou a ser empregado: letramento. A alfabetização consiste em aprender ou ensinar o sistema de escrita, enquanto letramento trata de utilizar os conhecimentos sobre a língua para realizar atividades de leitura e escrita na sociedade, com o objetivo de conquistar um novo estado ou condição. Isto é: saber decodificar as letras e as sílabas e, também, dar sentido a elas, conseguir compreender e interpretar o texto, entendendo seu uso real e social.
Com essa nova forma de olhar a alfabetização, surgiram novas perspectivas, como, por exemplo, o conceito de analfabetismo funcional, que agrupa pessoas que passaram pela escola e aprenderam a decodificar a língua escrita, mas não se tornaram usuários dela, sendo assim, embora saibam conectar letras e sons, não conseguem compreender o seu sentido. Conceitos como este estão sendo estudados e implementados, dando a possibilidade de que questões concernentes a este tema tão essencial para a educação sejam aprofundadas.
Vamos conhecer um pouquinho mais sobre o que está em pauta?
O que nos diz o Plano Nacional de Alfabetização?
Para que possamos pensar na alfabetização no Brasil é preciso, em primeiro lugar, entender que há uma diretriz nacional a respeito. Estamos falando do Plano Nacional de Alfabetização (PNA) que, no capítulo 2, discute especificamente os tópicos Alfabetização, Literacia e Numeracia. Nele, os conceitos são expostos de maneira clara e aprofundada, clique aqui e veja o material na íntegra, mas fique tranquilo, preparamos um breve resumo sobre o que a PNA apresenta, confira:
Segundo Luiz Carlos Faria da Silva, Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas Professor Adjunto do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá, a alfabetização deve acontecer no primeiro ano do Ensino Fundamental. Nesse momento, há dois focos: o princípio alfabético e as regras de decodificação e de codificação para habilitar as crianças à leitura e à soletração de palavras. Desta forma, é possível dizer que a alfabetização é o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético. Mas, afinal, o que é um sistema alfabético?
O sistema alfabético é constituído com os caracteres do alfabeto (letras) e os sons da fala. Há 6 mil anos, foram criados os primeiros sistemas de escrita, originalmente em forma de representações pictóricas. Mais recentemente, há 4 ou 5 mil anos, foi idealizada a escrita alfabética. No entanto, existem vários sistemas de escrita para diferentes línguas. Quando ensinamos alguém a ler e a escrever em um sistema, tratamos da representação gráfica que representa sons por meio de letras. Por isso, quando falamos no sistema utilizado no Japão, é observado a alfabetização por analogia, considerado, literacia, ensino de leitura e escrita independentemente do sistema de escrita utilizado. Desta forma, entendemos que literacia é a soma das habilidades, conjuntos de conhecimentos e atitudes relacionadas à leitura e à escrita.
Ler palavras e o mundo
São muitos fatores que envolvem esta área tão essencial da educação e, para grande parte dos profissionais da Educação, o Educador, Pedagogo e Filósofo, Paulo Freire (1921-1997) é fonte de inspiração. Sua obra reúne diversos textos, seminários e livros, e revela uma visão sobre o impacto que a educação pode gerar no mundo. Paulo Freire defendeu que aprender a ler e escrever é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto e poder transformá-lo. Em um trabalho intitulado “A importância do ato de ler” (1981), Freire afirma que um alfabetizando se insere em um processo criador, de que ele também é sujeito.
Como é fundamental o trabalho que os professores fazem! Além de ensinarem a ler e a escrever, conseguem participar ativamente de um processo que insere os estudantes em um lugar ativo, que abre sua percepção e seu poder criativo para o mundo. A linguagem, além de permitir comunicar, possibilita que o indivíduo navegue pelo mundo e compreenda o significado daquilo que o rodeia, tendo a chance de interferir, mudando-o. Enquanto o estudante se constitui e se reconhece como sujeito, constrói e reconstrói continuamente significados de uma realidade que poderá ser impactada por suas ações.
Sim, é muita responsabilidade! Cabe, então, ao professor, criar uma relação de diálogo com o estudante, desempenhando o papel de mediador de experiências, que podem ser apresentadas como provocações à criatividade e à capacidade de construção do conhecimento por parte dos alunos. Professores e alunos são pilares do processo de ensinar e aprender, que acontece apenas com as duas partes presentes. A união dos atores neste cenário poderá trazer novas visões e a compreensão de que a mudança para um mundo melhor é possível. A sala de aula se expande, dá o poder para que o estudante perceba as circunstâncias da realidade em que está inserido e concede a possibilidade de influenciá-la.
O dinâmico e bonito processo de alfabetização e de letramento permite que tenhamos um mundo com mais leitores de texto e, também, de contexto. Mais que isso: para um mundo em que há mais autoras e autores de seus próprios destinos, individual e coletivamente. Sendo assim, alfabetizar é corroborar com o movimento de humanizar o sujeito, ou seja, participar do desenvolvimento do educando, para que este se torne senhor de si, autônomo, consciente e sujeito da história.